
Fiz minha primeira tradução aos 16 anos. Conheci a um sueco que namorava uma brasileira e não falava português. A namorada desapareceu no mundo e ele queria enviar uma carta (!) aos pais dela. Escreveu em inglês, eu traduzi. A carta era longa, poética, sofrida. Entendi, nesse preciso momento, que mais que passar umas palavras ao português, eu precisava traduzir a angústia que ele sentia de ter sido deixado num altar que nunca existiu. Como todo bom cliente, uma vez entregue a tradução, ele comparou minha versão com a versão do Google Translate (que naquela época funcionava em marcha à ré) e pediu algumas explicações. Clients will be clients.
Muitos anos se passaram até que eu fiz minha primeira tradução profissional e remunerada. Estava terminando a faculdade e procurando uma maneira de ganhar dinheiro para me casar com um namorado alemão. Paguei a mensalidade da Catho e encontrei um anúncio de uma agência que buscava tradutores no par alemão > português. Nesse momento eu nem imaginava que existia um exército invisível de nós. Um teste e um NDA depois, em 2008, eu estava sentada na BemTradUz aprendendo a usar ferramentas CAT, trabalhar com terminologia e fazer controle de qualidade (um beijo pra BemTradUz!).
Minha primeira agência me ensinou tudo o que eu sei hoje. Lá fiz bons amigos que levo pela vida, aprendi a trabalhar com ética, paciência e comprometimento com a qualidade. Você não precisa começar sua carreira em uma agência e é bem possível que você construa uma carreira de sucesso sem nunca ter pisado em uma. Mas esses anos que eu passei com a BemTradUz, dinheiro nenhum do mundo é capaz de recompensar.
Minhoca de agência, depois da BemTradUz trabalhei em algumas outras mais, seduzida pelos salários cada vez mais altos. Alguns traumas depois (estas agências eram de chorar), comecei a traduzir de casa. Trabalhei com agências no Brasil e na Europa, aprendi contabilidade básica – como carga tributária e composição de preços. Aproveitei a flexibilidade do trabalho e me mudei pra Buenos Aires. Estava feliz, tomando vinho, escutando tango e traduzindo meus projetinhos honestos quando o bicho da agência voltou a me morder.
A Latinlingua, onde trabalho hoje, estava contratando tradutores in-house de português. Era um trabalho feito especialmente pra mim, mas eu estava muito traumatizada para voltar a trabalhar em relação de dependência. Sem muitas expectativas, algumas entrevistas depois eu estava contratada, pedindo minha residência permanente na Argentina e viajando no segundo metrô mais antigo do mundo todos os dias.
Na Latinlingua encontrei o espaço para desenvolver tudo que eu aprendi na BemTradUz. Aprendi que o mercado de tradução são vários e que nem todas as agências do mundo esperam que a gente traduza volumes homéricos pagando tarifas de Lilliput. Aprendi que uma boa tradução tem diversas camadas de trabalho e que escrever no idioma-alvo é apenas a primeira e mais fácil delas. Aprendi que nem todo cliente é implicante e que há muitos por aí querendo estabelecer parcerias de qualidade.
Há muitos anos eu vivo da tradução. É ela quem paga integralmente minhas contas. E meu primeiro cliente, o amigo sueco, continua sendo amigo e cliente. Começou a trabalhar em um grande banco canadense e, hoje, paga feliz todas as traduções que faço pra ele. E eu traduzo tudo, profissionalmente e com a mesma dedicação daquela primeira carta.
Chrystal Caratta é tradutora de alemão, inglês e espanhol para o português do Brasil. Reside em Buenos Aires e tem especial predileção por transcriação, terminologia, mídias sociais e controle de qualidade.
Linkedin